“(...) aquele que ora com fervor e confiança se faz mais
forte
contra as
tentações do mal e Deus lhe envia bons Espíritos para assisti-lo.
É este um socorro que jamais se lhe recusa,
quando pedido
com sinceridade.”
(Allan Kardec, O livro dos Espíritos, perg.
660).
Tiago gritava ao bater na porta:
- Estamos presos, nos tirem daqui... - na vã
esperança de alguém ouvir e tirá-los dali. Já era a segunda vez em pouco mais
de uma semana que ele ficava preso, e ainda estava confuso com o que havia
ocorrido na última vez.
A porta do armário só possuía maçaneta na
parte exterior, sendo impossível abri-la pela parte de dentro. Tiago pensou em
pular de encontro a porta, para tentar derrubá-la, mas viu que seria uma
péssima ideia, pois franzino do jeito que era, não iria causar nenhum arranhão
na madeira e provavelmente ganharia um hematoma no braço. Havia também o fato
que a porta se abria para o lado de dentro. Ele pensou então em ligar para
alguém, mas como se fosse obra do destino, o celular acusava “bateria fraca” e
não completava nenhuma ligação. Infelizmente Juliana estava – coincidentemente
– sem celular, pois o deixara no vestiário junto a suas roupas.
- Lascou... – disse Tiago em tom de
desapontamento, como se estivesse pensando alto.
- O que você disse? – perguntou Juliana se
sentindo um pouco melhor, pois passava por uma verdadeira “montanha-russa” de
agonia, hora sentia bastante dor, hora estava bem.
- Nada... – respondeu Tiago tentando
tranquilizar a amiga, e não contar-lhe o real motivo da aflição. A amiga não sabia que lugar era aquele
exatamente, e nem tinha ideia da historia do zelador.
- E agora? O que vamos fazer? – perguntou
aflita Juliana.
- Ainda não sei, estou tentando pensar em
alguma coisa... – disse Tiago num tom não muito confiante.
Passou-se algum tempo em que estavam ali
trancados, e o silêncio tomava conta do ambiente. Juliana levava as mãos ao
tornozelo de tempos em tempos fazendo algumas pequenas caretas, enquanto Tiago
volta e meia gritava, tentando chamar a atenção de alguém de fora.
- Você está com muita dor? – perguntou
prestativo Tiago.
- As dores vêm e vão, mas eu estou bem
agora... – respondeu um pouco manhosa Juliana.
– Não se preocupe, nós vamos conseguir sair
daqui e tratar do seu tornozelo... – disse Tiago no mesmo tom, sem muita
certeza na voz.
Nesse meio tempo Tiago olhou em volta e
pegou um caixote que ali estava, tirou a jaqueta que usava por cima do
uniforme, e apoiou o tornozelo da amiga.
Enquanto Tiago olhava preocupado para a
amiga, ela percebera que nunca havia ficado realmente sozinha com ele, e muito
menos imaginava que ele seria assim tão prestativo com ela. Sempre tivera uma
visão diferente sobre Tiago, era apenas mais um amigo. Quando Tiago pegou seu
tornozelo para apoiar no caixote, enrubesceu, mas esperava que na penumbra do
armário, o amigo não tivesse percebido.
Neste ínterim, os pensamentos de Tiago
voavam, estava preocupado sobre o fantasma do zelador e que ele poderia entrar
a qualquer momento ali, e fazer sabe lá o que com eles. Outra coisa o
incomodava, ali onde estavam foi onde o zelador havia morrido tragicamente, o
local devia estar “amaldiçoado”. E para piorar, não tinham como sair dali e nem
ao menos pedir ajuda. Não havia como piorar.
Neste momento, um rato atravessou de um lado
para o outro da sala, bem no meio dos dois, e Juliana, esquecendo toda a dor
que sentia no tornozelo, gritou e se agarrou no braço do amigo, enfiando a
cabeça no seu ombro para não ver o animal.
- Tem alguém aqui!? – disse Zaf abrindo a
porta do armário repentinamente.
Tiago e Juliana, ainda abraçados, olham
surpresos para Zaf.
- Ahn... Desculpa... Eu não queria
atrapalhar! – disse Zaf em tom de malandragem, começando a fechar a porta.
- Não é o que você está pensando!!! – disseram
Tiago e Juliana ao mesmo tempo, desta vez ambos vermelhos como tomates. – E não
feche a porta!!! – completou Tiago antes que o amigo os trancasse ali de novo.
Zaf auxiliou Tiago a retirar Juliana
da sala, apoiando-a sobre os ombros e acomodando-a numa cadeira logo adiante.
-
Eu aqui preocupado com vocês, revirando a escola toda, e vocês aí... Fazendo
sabe-se lá o que...- diz Zaf contrariado.
- Não é nada disso! – respondeu
Juliana envergonhada, porém brava. – É que tinha um rato lá dentro, e eu apenas
pulei assustada pra cima do Tiago, só isso...
- Sei... – disse desconfiado Zaf. – E
vocês estavam fazendo o que ali dentro sozinhos? Caçando ratos!? – disse em tom
irônico Zaf.
Tiago sem dar atenção ao amigo, vê
um pouco mais a frente o fantasma do zelador novamente, desta vez a entrar em
um dos corredores.
- E então Tiago, algum fato que
queira compartilhar conosco? – pergunta Zaf, colocando a mão sobre o ombro de
Tiago.
- Zaf, você pode levar a Juliana pra
enfermaria? Eu só vou ali verificar uma “coisinha” e já volto, tudo bem? Até
já... – diz Tiago se distanciando dos amigos sem esperar resposta.
- Mas eu nem sei onde fica a
enfer... Ah, já foi... Então tá, somos só você e eu Juliana... E tomara que não
encontremos nenhum rato no caminho, senão o Tiago pode ficar com ciúmes...
- Larga de ser chato garoto... –
respondeu contrariada Juliana.
Tiago correu em direção ao corredor
onde havia avistado o fantasma e, procurando entre as salas, avistou um vulto
adentrar na última sala daquele corredor. Até hoje, Tiago não se lembra onde
encontrou coragem para prosseguir, mas foi firme em direção à sala. Numa
curiosidade tremenda, esticou o pescoço para ver se o fantasma estava na sala,
porém, não havia ninguém ali.
Entrou na sala para verificar
melhor, e quando se posicionava bem ao meio da mesma, sentiu aquele calafrio
lhe vindo à nuca. Virando-se roboticamente para trás, viu o fantasma lhe
observando de cima a baixo, parecendo não entender nada.
- Você consegue me ver garoto? – diz
o zelador com voz rouca, virando a cabeça como quem observava um objeto
estranho.
- S-Sim... – gaguejou Tiago.
- Que interessante! Ninguém me
notava há muito tempo... Desde que aquilo aconteceu... – disse o zelador
olhando para baixo, em ar pensativo.
Tiago não conseguia acreditar que
aquilo era real, e que poderia mesmo estar acontecendo. Mas estava. Conseguia
sentir o odor fétido que vinha do zelador, de como quem nunca havia tomado um
banho, e um bafo que era de dar nó no estômago. Pensou: “Mas se era tudo real,
então da outra vez não fora um simples sonho?”.
- Você vê que ainda estou vivo, não
vê? – argumenta o zelador. – E que aqueles moleques, que me trancaram devem
pagar, não? Na verdade todos devem pagar, pois ninguém sequer gostava de mim, e
ainda hoje não gostam... Eu ouço eles pelos corredores, sabe? E ainda têm a
coragem de na mesma data em que ocorreu tudo aquilo, comemorarem e festejarem?
É um absurdo... – disse em tom tremendamente rancoroso.
E neste desabafo, o zelador se
enraiveceu, e ao seu lado, aparecem dois seres, aparentemente humanos também,
mas cujo rosto não se podia ver claramente, com capuzes pretos e mantos que
lhes caiam aos pés, davam risadas como hienas histéricas, numa cena medonha de
se descrever.
- É um velho caduco mesmo, depois de
todos esses anos, ainda não consegue entender.. – disse um deles, rindo de
forma frenética.
- Por isso não me canso dele, sempre
vai ser este trapo, e nunca sairá disso, como gosto de vê-lo sofrer... – disse
o outro rindo e debochando mais alto que o primeiro.
Foi quando pareceram notar a
presença de Tiago.
- Ei, olha só o que temos aqui... –
disse um deles tentando se aproximar.
- Sim, ele é um... é... é um sim!!
Vamos pegue ele!!!
Tiago ao ouvir aquelas palavras sentiu
um aperto tremendo no coração, e um medo profundo, não sabia o que fazer.
Lembrou-se então de Jesus, de Deus, do culto em que fora com Daniel, e também
do livro da vovó. Foi então que fez a primeira coisa que veio em sua mente. Fechando
os olhos e dizendo em voz alta, Tiago fez uma oração:
- Jesus, desculpe se venho a você
apenas em momento de precisão, porém por mais uma vez preciso de sua proteção. Me
ajude neste momento, e me afasta de todo o mal...
Neste momento luzes multicoloridas começaram
a iluminar a sala. Vinham do alto do teto, sem saber ao certo como. O clima
pesado começou a se amenizar, e os dois espíritos encapuzados foram paralisados
e de alguma forma empurrados para longe por força invisível, até desaparecerem
pela porta. O zelador, também sem entender o que estava acontecendo, começou a
ficar confuso e assustado.
- ... Abençoa este senhor a minha
frente, ajuda-o a encontrar o caminho, e faz com que ele tenha muita paz...
Uma luz cor violeta atingiu a fronte
do zelador quebrantando-o por inteiro. Lembranças de sua infância sofrida, ao
lado de sua mãe, lhe vieram à mente. Sentiu saudades daquele tempo, mesmo que
de dificuldades e pobreza, onde a mãezinha nunca o deixara abater o coração, e
sempre ajudava a superar tudo com carinho e amor.
A mãe do zelador neste momento
aparece em espírito para seu filho, recolhendo-o em seus braços. O zelador chorava
copiosamente no seio materno, e se parecia agora mais como uma criança, do que
com o velho cansado de momentos atrás.
- Me perdoe mãe... Eu não... Eu não
queria... – dizia emocionado com a voz embargada.
Sua mãe, num sorriso esplêndido de
felicidade por finalmente o filho a ter percebido. Levou as mãos aos seus olhos,
fechando-os devagar. Abraçou o filho apertadamente contra o peito, quando luz
mais forte se fez na sala, e naquele momento, mãe e filho desapareceram do
local.
- ... Peço ajuda, pois sei que tenho
pouca fé, mas grande é a sua força. Obrigado por tudo amigo Jesus.
Ao abrir os olhos aos poucos, Tiago
verificou que estava sozinho na sala, para a sua surpresa e alívio. Caminhou em
direção à porta, porém, sentindo-se um pouco zonzo e cansado, resolveu
sentar-se um pouco, pois grandes foram as emoções daquele dia, e mesmo que não
soubesse disso ainda, muitas outras estavam por vir.
CRIAÇÃO
Michael
Menezes Martins
Márcio
de Sousa Mateus Jr.
REVISÃO
Nísia
Anália
Khal
Rens Cândido
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Esse foi bom em? Até a proxima semana pessoal :]